segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Álvaro Dias: "será mais fácil fazer oposição"


O Brasil acordou em 1 de novembro com uma nova presidente. A 40ª na história republicana, primeira mulher a governar o país.


Alegria para mais de 55% dos eleitores, inconformismo para os setores derrotados. Na TV, o senador Álvaro Dias afirma que será muito mais fácil fazer oposição a Dilma Rousseff do que ao presidente Lula, já que ela não conta com “o preparo e a inteligência” daquele. Pode até ser verdade. No entanto, há algo mais importante no ar que ainda não foi devidamente captado pela oposição: a época da política arrogante passou.

Luis Inácio Lula da Silva governou com humildade, buscando contato direto com o povo, ouvindo seus anseios, fazendo o possível para oferecer respostas objetivas ao que lhe era solicitado. O povo precisa de comida? Dê-lhe Bolsa Família. Precisa de moradia? Dê-lhe Minha Casa, Minha Vida. Deseja estudar? Dê-lhe Prouni. Está no escuro? Dê-lhe Luz Para Todos. Ao invés de elucubrações complicadas (conversa para boi dormir) típica de quem acha que pode levar o povo na lábia, respostas objetivas. Foi justamente por se voltar para os pequenos que Lula se tornou grande internacionalmente – estatura que tende a crescer ainda mais se o governo da presidente Dilma for bem sucedido. Se não, resta a possibilidade dele retornar em 2014.

A oposição se perdeu em falatórios e guerra de egos. Aécio Neves é acusado de ter feito “corpo mole” durante a campanha em MG – acusação evidenciada pelo fato do estado ter elegido Dilma Rousseff. Álvaro Dias, que amanheceu na segunda-feira cantando de galo, dias atrás chorava pitangas por ter sido preterido para o posto de vice na chapa de Serra. “Eu fui traído desde o primeiro momento no Paraná pelo meu partido”, afirmou ao IG em 29 de setembro. A história mostra que a arrogância desta agremiação vem de longe: em 2006 o então candidato à presidência Geraldo Alckmin foi abandonado pelo atual derrotado José Serra, por Aécio Neves, por Tasso Gereissati, por FHC e pelo próprio Álvaro Dias, fato que lhe custou (e ao partido, obviamente) uma acachapante derrota com o cruel requinte de obter menos votos no segundo turno do que havia alcançado no primeiro. Em 1984 Fernando Henrique (então no PMDB) tinha tanta certeza da vitória que se deixou fotografar como prefeito de São Paulo antes mesmo das eleições. Acabou perdendo para Jânio Quadros.

O fato é que, por falta de discurso, a oposição se torna medíocre e transforma o debate político em guerra de comadres. Os avanços sociais do governo Lula não deixaram migalhas para a oposição que governou durante 8 anos como se não houvesse pobres no Brasil e respondia os anseios populares com erudição vazia. Isso não funciona mais, pois qualquer analfabeto já se deu conta de que a lógica neoliberal do estado mínimo não enche barriga.

Esta oposição carece de discurso e de rumo. A menos que consiga abandonar a postura arrogante e aprender com os próprios erros, seguirá derrotada por muitos anos - talvez mais uma década.

Já vai longe o tempo em que o presidente da República podia declarar que preferia o cheiro de seus cavalos ao do povo – como o fez o general João Baptista Figueiredo. Só que ele não dependia do povo para ser presidente. Quem depende do voto popular, ou supera a arrogância ou continua derrotado.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Rapaz denuncia quem teria jogado objeto em José Serra


Com a condição de sigilo, um rapaz afirmou que a bolinha de papel que atingiu o candidato José Serra foi atirada pelo coordenador da campanha do tucano, o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE). Segundo a fonte, Guerra queria chamar a atenção do candidato mas não conseguia, por causa da distância. Decidiu então amassar um bilhete que trazia no bolso e arremessar em José Serra. Assista o vídeo da reportagem feita pelo SBT e reproduzida no Youtube.

Guerra ficou profundamente preocupado, por saber que Serra tem miolo mole e que nada pode atingir sua cabeça, pois ele sente tonturas e náusea. No entanto, em seguida ficou ficou aliviado ao perceber que nada tinha acontecido ao candidato, mas a tranquilidade durou apenas 20 minutos. Um manifestante do PT ligou para o ex-governador e o avisou que ele tinha sido atingido. “Foi pura maldade! Só para prejudicar o Serra”, revolta-se o informante. “Ele nem tinha percebido, mas aí vem esse mau caráter e avisa e o candidato começou a passar mal”.

O boletim médico divulgado hoje de manhã informa que o candidato continua abilolado.

MENTIRA POR MENTIRA, PREFIRO A MINHA.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Marina... você se pintou?

Nunca tinha reproduzido textos de outros autores no meu blog. Mas a carta aberta à senadora Marina Silva, escrita pelo filósofo Maurício Abdalla, justifica a exceção.

Maurício Abdalla*

“Marina, morena Marina, você se pintou” – diz a canção de Caymmi. Mas é provável, Marina, que pintaram você. Era a candidata ideal ideal:mulher,militante, ecológica e socialmente comprometida com o “grito da Terra e o grito dos pobres”, como diz Leonardo.
Dizem que escolheu o partido errado. Pode ser. Mas, por outro lado, o que é certo neste confuso tempo de partidos gelatinosos, de alianças surreais e de pragmatismo hiperbólico? Quem pode atirar a primeira pedra no que diz respeito a escolhas partidárias?
Mas ainda assim, Marina, sua candidatura estava fadada a não decolar. Não pela causa que defende, não pela grandeza de sua figura. Mas pelo fato de que as verdadeiras causas que afetam a população do Brasil não interessam aos financiadores de campanha, às elites e aos seus meios de comunicação. A batalha não era para ser sua. Era de Dilma contra Serra. Do governo Lula contra o governo do PSDB/DEM. Assim decidiram as “famiglias” que controlam a informação no país. E elas não só decidiram quem iria duelar, mas também quiseram definir o vencedor. O Estadão dixit: Serra deve ser eleito.
Mas a estratégia de reconduzir ao poder a velha aliança PSDB/DEM estava fazendo água. O povo insistia em confirmar não a sua preferência por Dilma, mas seu apreço pelo Lula. O que, é claro, se revertia em intenção de voto em sua candidata. Mas “os filhos das trevas são mais espertos do que os filhos da luz”. Sacaram da manga um ás escondido. Usar a Marina como trampolim para levar o tucano para o segundo turno e ganhar tempo para a guerra suja.
Marina, você, cujo coração é vermelho e verde, foi pintada de azul. “Azul tucano”. Deram-lhe o espaço que sua causa nunca teve, que sua luta junto aos seringueiros e contra as elites rurais jamais alcançaria nos grandes meios de comunicação. A Globo nunca esteve ao seu lado. A Veja, a FSP, o Estadão jamais se preocuparam com a ecologia profunda. Eles sempre foram, e ainda são, seus e nossos inimigos viscerais.
Mas a estratégia deu certo. Serra foi para o segundo turno, e a mídia não cansa de propagar a “vitória da Marina”. Não aceite esse presente de grego. Hão de descartá-la assim que você falar qual é exatamente a sua luta e contra quem ela se dirige.
“Marina, você faça tudo, mas faça o favor”: não deixe que a pintem de azul tucano. Sua história não permite isso. E não deixe que seus eleitores se iludam acreditando que você está mais perto de Serra do que de Dilma. Que não pensem que sua luta pode torná-la neutra ou que pensem que para você “tanto faz”. Que os percalços e dificuldades que você teve no Governo Lula não a façam esquecer os 8 anos de FHC e os 500 anos de domínio absoluto da Casagrande no país cuja maioria vive na senzala. Não deixe que pintem “esse rosto que o povo gosta, que gosta e é só dele”.
Dilma, admitamos, não é a candidata de nossos sonhos. Mas Serra o é de nossos mais terríveis pesadelos. Ajude-nos a enfrentá-lo. Você não precisa dos paparicos da elite brasileira e de seus meios de comunicação. “Marina, você já é bonita com o que Deus lhe deu”.

* Professor de filosofia da UFES, autor de Iara e a Arca da Filosofia (Mercuryo Jovem), entre outros.


domingo, 3 de outubro de 2010

A Origem: um filme para abalar convicções

O filme "A Origem" (Inception, EUA, 2010. Direção: Christopher Nolan) convida o espectador a mergulhar no universo dos sonhos qual um caçador de pérolas que vai buscar seu tesouro sob as águas, em abismo incerto. No caso, o tesouro consiste na gênese das nossas convicções, a origem das certezas que determinam nossas escolhas e influenciam o cotidiano.

Dom Cobb (Leonardo DiCaprio) é um ladrão de sonhos, reconhecido como o melhor de todos. Ele domina com maestria a perigosa arte de invadir sonhos alheios para arrancar informações que podem valer milhões de dólares no competitivo mercado das grandes corporações.

O pedido de um cliente, no entanto, é considerada uma empreitada arriscadíssima até para o experiente Cobb. Ao invés de roubar informações, ele precisará mergulhar nos sonhos do magnata da área energética Robert Fischer (Cillian Murphy) para plantar uma ideia que posteriormente resultará em decisões que interessam ao contratante. Para isso, ele precisará explorar profundamente a psique da vítima, invadindo sonhos após sonhos, um dentro do outro, até um nível seminal no qual a semente possa ser lançada.


Cobb só aceita o risco porque receberá como recompensa a possibilidade de se reunir novamente aos filhos nos EUA, de onde fugiu por causa da acusação de ter matado a própria esposa Mal (Marion Cotillard).

Dom Cobb não age sozinho. Sobre os demais personagens, vale a pena ler duas postagens em blogs: o Saindo da Matrix (clique) faz uma interessante exegese dos nomes dos personagens; já o The World Is Garbage! (clique) analisa os personagens na perspectiva dos arquétipos junguianos.

É deliciosamente perturbadora a dúvida que Christopher Nolan semeia com seu festejado filme: qual é a origem das nossas convicções? Pode ser perturbador nos darmos conta de que algumas das nossas crenças mais firmes resultam de intervenções (na psicanálise, a condução do fluxo de pensamentos por outrem) efetivadas pela família, pela igreja, pela escola, pelo Estado, pelo discurso hegemônico dos meios de comunicação etc. Por outro lado, é delicioso ser lembrado que nossas certezas podem não ser assim tão certas, o que nos desobriga de cumpri-las ao pé da letra.

A Origem é um filme antológico repleto de efeitos especiais absolutamente necessários, diferentemente do que se vê frequentemente nas produções hollywoodianas.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

A pieguice de Vik Muniz

Que tal comprar uma jóia e carregar a embalagem pendurada no peito? Guardadas as diferenças, é o que propõe a mostra “Verso”, do festejado artista plástico Vik Muniz, inaugurada hoje na Galeria Fortes Vilaça, em São Paulo.


Embora diferente, a ideia é simples: mostrar o verso de obras célebres como “Les Demoiselles d’Avignon”, de Picasso, “Starry Night”, de Van Gogh, “Samba”, de Di Cavalcanti e “O Abaporu”, de Tarsila do Amaral, entre outras, devidamente identificadas com inscrições à mão e etiquetadas pelos museus onde já foram expostas. Não contente com a esquisitice de mostrar apenas o dorso das obras famosas, o artista o faz apresentando reproduções.

Desde que Duchamp levou urinol e roda de bicicleta para dentro das galerias, as artes visuais encontraram uma nova expressão – tridimensional e desvinculada da representação formal. Ocorre que Duchamp era um tirador de sarro que certamente rola de rir na tumba com a “pagação de pau” das plateias compenetradas diante de seu urinol-arte – como tive oportunidade de presenciar na exposição comemorativa dos 60 anos do MAM de São Paulo, ocorrida em 2008. “Banalizaram a arte!”, gritava o urinol de Duchamp para a sociedade da época. Pois a atual consegue ser pior, sacralizando banalidades.

Vik Muniz ficou conhecido nos anos 1990 por utilizar materiais inusitados para reproduzir imagens consagradas, como a Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, reproduzida com pasta de amendoim, e obras de Monet reproduzidas com açúcar mascavo. Quem adquire as “obras” leva para casa apenas a reprodução fotográfica das mesmas. Ou seja, o festejado artista vende reproduções de reproduções.

Ao apresentar cópias (muito bem acabadas) do verso das obras, Muniz propõe trocar a fruição estética pela atitude consumista, reforçando o primado do objeto sobre o conceito, do tangível sobre o intangível, do palpável sobre o abstrato, da embalagem sobre o conteúdo. Exibir a caixa de jóias no peito é piegas, todos hão de convir, da mesma forma como talvez concordem que é piegas a mostra de Vik Muniz.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

McDonald’s e Franz Kafka: tudo a ver

Tudo que queríamos era tomar um singelo sorvete. Andávamos sem rumo pela avenida Paulista no fim de um longo domingo e a opção mais óbvia foi o McDonald’s. Lá fomos eu, Fernanda, Alice, Pedro e Douglas.

O desejo por sorvete não combinava com o clima. Chá quente ou capuccino era o que o vento gelado recomendava, mas queríamos sorvete.
Entramos no McDonald's e constatei aliviado que estava vazio. O balcão de sorvetes perto da entrada permite fazer pedidos tanto de dentro da loja, onde estávamos, como do lado de fora, onde há uma simpática varanda. Fizemos o óbvio: dirigimo-nos à atendente e pedimos pelo número.
– Senhor, só posso te atender pelo lado de fora.
– Ãhh?!?!
– O senhor tem que ir do lado de fora da loja, para fazer o pedido.
– Como assim?
– Não posso te atender por aqui. O senhor precisa sair da loja e dirigir-se à varanda, para fazer o pedido.
– Mas moça, aqui há um balcão, eu estou te vendo e você me vê, estamos um ouvindo o outro. Não posso fazer meu pedido?
– Por aqui, não. A câmera não deixa.
– Câmera? Que câmera?
– Aquela ali. Ela está ligada e eu não posso te atender por aqui.
– Mas...
Solenemente, a atendente me deu as costas e chamou: – Próximo!
Era a cena do mês. A mais esquisita.
– Moça, por favor. Eu ainda não entendi. Por que preciso sair da loja para ser atendido?
Visivelmente irritada, ela me ignorou.
Eu não sou chato. Resignado, saí para o frio e fui até à parte externa do balcão. Foram pedidos milk shakes, sundaes e outras delícias padronizadas. Para mim, apenas uma casquinha mista, de chocolate e creme.
– Aqui só temos creme. Se o senhor quiser chocolate, terá que pedir no balcão principal.
– Aquele que fica dentro da loja?
– Isso mesmo. Qual sabor o senhor vai querer?
– Quero casquinha mista, de chocolate e creme.
– Aqui só temos creme.
– Lá dentro tem misto?
– Não. Lá só tem chocolate.
– Ãhhhh?!?!
– Sim. Aqui só tem creme. Lá dentro, só chocolate. Qual o senhor vai querer?
– Quero os dois juntos. Misto, entende?
– Não tem.
– Mas está no cardápio.
– Eu sei, mas não tem. Qual o senhor quer?
– Puxa, moça. Está difícil. Eu queria misto.
– Então o senhor decide enquanto atendo outro cliente. Próximo!
– Já decidi, moça. Me dá qualquer um que você tiver aí.
– Qual?
– Qualquer um.
– O senhor tem que dizer. A câmera está ligada e o senhor tem que falar qual é o seu pedido.
– Tá bom. Eu quero de creme. É esse que tem aqui fora ou é o de lá de dentro?
– Não. Creme é aqui mesmo. São R$ 1,50. Algo mais?
– Só isso. Aliás, mais uma pergunta: depois que comprar o sorvete eu posso entrar na loja para tomar lá dentro? Aqui está frio.
– Pode.

Se você aí lembrou de Franz Kafka, acertou na mosca. Sendo mais específico, na barata, pois o asqueroso ser que surgiu do nada e começou a passear livremente pelo chão da lanchonete, como se conferisse o "bom" atendimento dado à clientela, parecia saído do romance Metamorfose (download gratuito). Rapidamente saquei o celular com a intenção de fotografar a ilustre presença, mas ele é uma péssima câmera fotográfica. Fico devendo o registro.